Resistência
E ainda existem poemas em mim
Em minhas mãos ainda sinto a textura
Ainda quero mesmo não acreditando mais
Ainda espero mesmo que seja tão tarde
Ainda queimo o fogo que me arde
Ainda sou pura saindo do mesmo pecado
Ainda que tudo possa parecer estranho,
E tudo se revele errado.
Eu arranho a pele pra me sentir viva
E viva trago cada palavra sua e cada gesto,
E o timbre de sua voz ainda me canta e encanta
E longe, você dá suas perolas aos cães!
E eu dou minhas perolas aos porcos!
E ainda espero suas lágrimas mais silenciosas
Essas de noites turvas de vinho e desgosto
E seu rosto, invisível rosto entre tantos
Sombrio vulto magoando minhas estrelas
Estranho amor de tão conhecida Pátria,
Não quero mais falar de amor!Nem você!
E não podemos mais e você não pode.
Sua força se curva ante o destino e não pode mais
Não tem uma arma, nem se mira na penumbra
Ou no volume dos canteiros acesos de pirilampos
Nessas noites em que o topázio brilha ante o fogo
De um desejo tão puro e tão dramaticamente condenado
Ao desuso ao descaso, ao lixo de ver ir embora toda vez
Sua veia exaltada ai na têmpora orvalhada de suor e sangue.
E te saber assim tão perfeito pra mim,
E tão cruel pra meu desgosto
Porque tem essa doçura ignorante
E a arrogância dos aflitos.
Espremo meu grito ate que se cale!
E te perseguido sem que nada me fale,
Mesmo que tudo se cale dentro do teu fulgor!
Espreito-te feito animal acuado, recuo, mas retorno
E torno-me espectadora de tua insana dor!

Claudia Morett