O REGRESSO DE LILITH (excertos)
Joumana Haddad
Eu sou Lilith, a deusa das duas noites, que regressa do exílio.Sou
Lilith, a mulher-destino. Nenhum macho pode escapar à minha sorte, e
nenhum macho lhe quererá escapar.
Eu sou as duas luas Lilith. A negra é complementada pela branca, pois a
minha pureza é a centelha do deboche e minha abstinência, o princípio do
possível. Eu sou a mulher-paraíso, que caiu do paraíso, sou a
arrasa-paraísos.
Sou a virgem, rosto invisível da devassa, a mãe-amante e a mulher-homem.
A noite porque eu sou o dia, o lado direito porque sou o lado esquerdo,
e o Sul porque sou o Norte.
Eu sou Lilith dos seios brancos. Irresistível é o meu encanto, pois os
meus cabelos são negros e longos e de mel os meus olhos. Diz a lenda que
fui criada a partir da Terra para ser a primeira mulher de Adão, mas
não me submeti.
Sou a mulher-festa e os convidados da festa. Feiticeira alada da noite é
o meu apelido, e sou deusa da tentação e desejo. Chamaram-me patrona do
prazer gratuito e da masturbação, liberta da condição de mãe para ser o
destino imortal.
Eu sou Lilith, que retorna da masmorra do esquecimento branco, leoa do
senhor e deusa das duas noites. Recolho na minha taça o que não pode ser
recolhido, e bebo-o pois sou a sacerdotisa e o templo. Esgoto todas as
intoxicações para que não acreditem que eu posso beber. Faço amor comigo
mesma e e reproduzo-me para criar um povo da minha linhhagem, depois
mato os meus amantes para dar espaço àqueles que ainda não me
conheceram.
Regresso do calabouço do esquecimento branco para quem ainda me não
conhece, volto para marcar lugar e para que não creiam que eu posso
beber, da brancura do esquecimento para enraizar a vida e para que o
número cresça, para matar os meus amantes eu regresso.
Eu sou Lilith, a mulher-floresta. Não vivi uma espera desejável, mas
sofri os leões e as espécies puras de monstros. Fecundo todas as minhas
costas para construir a história. Agrego as vozes nas minhas entranhas
para que o número de escravos esteja completo. Como o meu próprio corpo
para que me não tratem como faminta e bebo a minha água para nunca
sofrer a sede. As minhas tranças são longas no inverno, e as minhas
malas não têm tecto. Nada me satisfaz, nem me sacia, e eis que regresso
para ser a rainha dos perdidos no mundo.
Sou a guardiã do bem e do encontro dos opostos. Os beijos no meu corpo
são as feridas de quem tentou. Da flauta das duas coxas sobe o meu
canto, e do meu canto a maldição espalha-se em água sobre a terra.
Sou Lilith, a leoa sedutora. Mão de cada servidor, janela de cada
virgem. Anjo da queda e consciência do sono leve. Filha de Dalila, Maria
Madalena e das sete fadas. Nenhum antídoto para a minha condenação. Da
minha luxúria, erguem-se as montanhas e abrem-se os rios. Venho de novo
para furar com as minhas ondas o véu do pudor, e para limpar as feridas
da falta com o perfume do deboche.
Da flauta das duas coxas sobe o meu canto
E da minha luxúria abrem-se os rios.
Como não poderia haver uma maré
de cada vez que entre os meus verticais lábios brilha um sorriso?
Porque eu sou a primeiro e a última
A cortesã virgem
O medo cobiçado
A adorada desprezada
E a velada desnuda
Porque eu sou a maldição do que precede,
O pecado desaparecido dos desertos quando abandonei Adão.
Ele andou aqui e ali, quebrou a sua perfeição.
Desci-o à terra e acendi para ele a flor da figueira.
Eu sou Lilith, o segredo dos dedos que insistem. Quebro caminhos divulgo
sonhos rebento as cidades do macho com o meu dilúvio. Não reuno dois de
cada espécie na minha arca Em vez disso, volto a eles, para que o sexo
se purifique de toda a pureza.
Eu, versículo da maçã, os livros escreveram-me, ainda que não me tenham
lido. Prazer desenfreado esposa rebelde o cumprimento da luxúria que
leva à ruína total. Na loucura se entreabre a minha camisa. Os que me
escutam merecem morrer, e aqueles que me não escutam morrerão de
despeito.
Eu não sou nem a rebelde nem a égua fácil.
Antes o desvanecer do pesar último.
Eu Lilith o anjo devasso. Primeira fuga de Adão e corrompidora de
Satanás. O imaginário do sexo reprimido e o seu mais alto grito. Tímida
pois sou a ninfa do vulcão, ciumenta pela doce obsessão do vício. O
primeiro paraíso não pôde suportar-me. E caçaram-me para que eu semeie a
discórdia na terra, para que governe nos leitos os assuntos dos meus
sujeitos.
Sorte dos conhecedores e deusa das duas noites. União do sono e do
despertar. Eu, o feto-poetisa, ao perder-me ganhei a vida. Regresso do
meu exílio para ser a esposa dos sete dias e as cinzas do amanhã.
Eu sou a leoa sedutora e volto para cobrir as submissas de vergonha e
para reinar sobre a terra. Venho para curar a costela de Adão e liberar
cada homem da sua Eva.
Sou Lilith
Regresso do meu exílio
Para herdar a morte da mãe a que dei vida.
Joumana Haddad
Joumana Haddad
Eu sou Lilith, a deusa das duas noites, que regressa do exílio.Sou
Lilith, a mulher-destino. Nenhum macho pode escapar à minha sorte, e
nenhum macho lhe quererá escapar.
Eu sou as duas luas Lilith. A negra é complementada pela branca, pois a
minha pureza é a centelha do deboche e minha abstinência, o princípio do
possível. Eu sou a mulher-paraíso, que caiu do paraíso, sou a
arrasa-paraísos.
Sou a virgem, rosto invisível da devassa, a mãe-amante e a mulher-homem.
A noite porque eu sou o dia, o lado direito porque sou o lado esquerdo,
e o Sul porque sou o Norte.
Eu sou Lilith dos seios brancos. Irresistível é o meu encanto, pois os
meus cabelos são negros e longos e de mel os meus olhos. Diz a lenda que
fui criada a partir da Terra para ser a primeira mulher de Adão, mas
não me submeti.
Sou a mulher-festa e os convidados da festa. Feiticeira alada da noite é
o meu apelido, e sou deusa da tentação e desejo. Chamaram-me patrona do
prazer gratuito e da masturbação, liberta da condição de mãe para ser o
destino imortal.
Eu sou Lilith, que retorna da masmorra do esquecimento branco, leoa do
senhor e deusa das duas noites. Recolho na minha taça o que não pode ser
recolhido, e bebo-o pois sou a sacerdotisa e o templo. Esgoto todas as
intoxicações para que não acreditem que eu posso beber. Faço amor comigo
mesma e e reproduzo-me para criar um povo da minha linhhagem, depois
mato os meus amantes para dar espaço àqueles que ainda não me
conheceram.
Regresso do calabouço do esquecimento branco para quem ainda me não
conhece, volto para marcar lugar e para que não creiam que eu posso
beber, da brancura do esquecimento para enraizar a vida e para que o
número cresça, para matar os meus amantes eu regresso.
Eu sou Lilith, a mulher-floresta. Não vivi uma espera desejável, mas
sofri os leões e as espécies puras de monstros. Fecundo todas as minhas
costas para construir a história. Agrego as vozes nas minhas entranhas
para que o número de escravos esteja completo. Como o meu próprio corpo
para que me não tratem como faminta e bebo a minha água para nunca
sofrer a sede. As minhas tranças são longas no inverno, e as minhas
malas não têm tecto. Nada me satisfaz, nem me sacia, e eis que regresso
para ser a rainha dos perdidos no mundo.
Sou a guardiã do bem e do encontro dos opostos. Os beijos no meu corpo
são as feridas de quem tentou. Da flauta das duas coxas sobe o meu
canto, e do meu canto a maldição espalha-se em água sobre a terra.
Sou Lilith, a leoa sedutora. Mão de cada servidor, janela de cada
virgem. Anjo da queda e consciência do sono leve. Filha de Dalila, Maria
Madalena e das sete fadas. Nenhum antídoto para a minha condenação. Da
minha luxúria, erguem-se as montanhas e abrem-se os rios. Venho de novo
para furar com as minhas ondas o véu do pudor, e para limpar as feridas
da falta com o perfume do deboche.
Da flauta das duas coxas sobe o meu canto
E da minha luxúria abrem-se os rios.
Como não poderia haver uma maré
de cada vez que entre os meus verticais lábios brilha um sorriso?
Porque eu sou a primeiro e a última
A cortesã virgem
O medo cobiçado
A adorada desprezada
E a velada desnuda
Porque eu sou a maldição do que precede,
O pecado desaparecido dos desertos quando abandonei Adão.
Ele andou aqui e ali, quebrou a sua perfeição.
Desci-o à terra e acendi para ele a flor da figueira.
Eu sou Lilith, o segredo dos dedos que insistem. Quebro caminhos divulgo
sonhos rebento as cidades do macho com o meu dilúvio. Não reuno dois de
cada espécie na minha arca Em vez disso, volto a eles, para que o sexo
se purifique de toda a pureza.
Eu, versículo da maçã, os livros escreveram-me, ainda que não me tenham
lido. Prazer desenfreado esposa rebelde o cumprimento da luxúria que
leva à ruína total. Na loucura se entreabre a minha camisa. Os que me
escutam merecem morrer, e aqueles que me não escutam morrerão de
despeito.
Eu não sou nem a rebelde nem a égua fácil.
Antes o desvanecer do pesar último.
Eu Lilith o anjo devasso. Primeira fuga de Adão e corrompidora de
Satanás. O imaginário do sexo reprimido e o seu mais alto grito. Tímida
pois sou a ninfa do vulcão, ciumenta pela doce obsessão do vício. O
primeiro paraíso não pôde suportar-me. E caçaram-me para que eu semeie a
discórdia na terra, para que governe nos leitos os assuntos dos meus
sujeitos.
Sorte dos conhecedores e deusa das duas noites. União do sono e do
despertar. Eu, o feto-poetisa, ao perder-me ganhei a vida. Regresso do
meu exílio para ser a esposa dos sete dias e as cinzas do amanhã.
Eu sou a leoa sedutora e volto para cobrir as submissas de vergonha e
para reinar sobre a terra. Venho para curar a costela de Adão e liberar
cada homem da sua Eva.
Sou Lilith
Regresso do meu exílio
Para herdar a morte da mãe a que dei vida.
Joumana Haddad