(de Edgar Allan Poe)
Foi há muitos e muitos anos já, Num reino de ao pé do mar.
Como sabeis todos, vivia lá Aquela que eu soube amar;
E vivia sem outro pensamento Que amar-me e eu a
adorar.
Eu era criança e ela era criança, Neste reino ao pé do mar;
Mas o nosso amor era mais que amor -- O meu e o dela a
amar; Um amor que os anjos do céu vieram a ambos nós
invejar.
E foi esta a razão por que, há muitos anos, Neste reino ao pé
do mar, Um vento saiu duma nuvem, gelando A linda que eu
soube amar; E o seu parente fidalgo veio De longe a me a
tirar, Para a fechar num sepulcro Neste reino ao pé do
mar.
E os anjos, menos felizes no céu, Ainda a nos invejar...
Sim, foi essa a razão (como sabem todos, Neste reino ao pé do
mar) Que o vento saiu da nuvem de noite Gelando e matando
a que eu soube amar.
Mas o nosso amor era mais que o amor De muitos mais velhos a
amar, De muitos de mais meditar, E nem os anjos do céu lá
em cima, Nem demônios debaixo do mar Poderão separar a
minha alma da alma Da linda que eu soube amar.
Porque os luares tristonhos só me trazem sonhos Da linda que eu
soube amar; E as estrelas nos ares só me lembram olhares
Da linda que eu soube amar; E assim "stou deitado toda a noite
ao lado Do meu anjo, meu anjo, meu sonho e meu fado, No
sepulcro ao pé do mar, Ao pé do murmúrio do mar.
Trad. Fernando Pessoa
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