De vez em quando um fantasma do passado vem bater à nossa porta. Chega de mansinho, e como se já tivesse sido exorcizado, quer mostrar que pode fazer parte da nossa vida em outras bases.
Mas então, quando acendemos a luz sem avisá-lo, em um vislumbre encaramos a sua face: disforme, com uma expressão rígida, a ausência de brilho no olhar. Existem situações que parecem não mudar. Talvez os fantasmas possam ser tão concretos quanto à realidade.
Encarei um fantasma deste tipo ontem. Sentimentos que há muito não se faziam presentes vieram à tona e foram tomando conta de mim enquanto eu estava sob influência dele: uma mistura de pena, mágoa, tristeza, desespero, solidão... Uma sensação de encarceramento naquela determinada situação como se eu nunca fosse ficar livre de tudo aquilo. Como se eu estivesse condenada a viver sob a constante ameaça dele sobre mim.
Levantei a voz. Fui firme. Não cedi às chantagens de uma figura que não tem relevância na minha vida presente. Precisei gastar cada migalha disponível das minhas energias. A batalha foi equilibrada, mas eu terminei o confronto me sentindo pequena, diminuída, frágil, entregue à sensação de estar perdida num labirinto no qual entrei por vontade própria.
Esse fantasma vai continuar fazendo parte da minha vida. Para que eu fique livre dele preciso acender as luzes, perder o medo e limpar a sujeira. Não deixar móveis em desuso, nem pilhas de papéis empilhados dos quais ele possa se utilizar para fazer seus esconderijos.
Ele ainda me assusta porque eu o autorizo a fazer isso. Mas eu vou encontrar formas de exorcizá-lo. Ele deixará de ter efeito sobre mim. E passará a ser uma mera lembrança de um passado definitivamente morto e enterrado. Com as devidas flores em sua lápide.
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O amor resiste à distância, ao silêncio das separações e até às traições. Sem perdão não há amor. Diga-me quem você mais perdoou na vida, e eu então saberei dizer quem você mais amou.