Acorda agora pela primeira vez,
e lento corre o mundo sem ti,
uma alma contaminada e triste,
sabendo que houve um tempo em que a vida,
ardia em cada amor,
deixando um vazio perfeito no passado.
Quis-te como uma louca,
porque tudo foi meu desde sempre,
sonhar com gigantes,
que continuam submersos,
como os deixaste,
como se cada coisa se inflamasse no ar,
ardesse, fosse fumo e brasa,
como tempestade nos seus dias breves.
E de súbito, a sombra morta do tempo junto de ti,
quando o destino já não é uma desculpa,
apenas solidão e surpresa tranquila,
do amor que não existe e provoca-me,
querendo dizer que existe o mundo,
o muito que somos iguais ao mar.
Mas não consegui mudar a forma de uma nuvem,
e é muito provável que eu acabe por existir contigo,
quando o rio parar de correr,
e a noite acenda uma labareda nos dedos,
e esta casa sombria não pareça a nossa,
como do oceano é a bruma, o leve marulhar,
ou é da cidade a cor esquiva da tarde,
como gesto final do ocaso,
insinuando o seu final.
Em ti, ser é estar, em fogo,
Queimando páginas retorcidas de sentimentos
Rasgar, num só golpe, a carne que nos une,
Na noite quente, suavizada pela brisa,
Vendo a lua, na bruma centenária de uma árvore,
Amando, vociferando contra o passado,
Cruel, mas morto para nós.
Por ti, correndo em tua pele os meus dedos,
Temerosos de ferir, querendo agarrar,
Deixar fugir, em silêncio, da rua vazia,
os pássaros voando, aqui, desde o rio, sem parar,
sem um rumor de ti.
É o feroz medo de estar aqui, neste mundo, só,
Ouvindo a sala vazia ranger no escuro absoluto,
Desprovido de risos, deixando degraus vazios,
Marcados por passos ausentes,
Deixando antever o fim das horas e as horas de chuva,
Ao arrepio de quem declama como ninguém,
Por não existires, neste momento, em mim.
Depois da luz da manhã mais bonita de Lisboa,
O mar batia, saltava e reclamava da tua insolência,
Zombando de tanta inocência,
Por amares sem culpa, verdadeiramente,
Entregando o teu corpo, sem reservas.
O meu interesse por ti, sou eu mesmo,
Ancorado no mar mais profundo,
De vigia na barra às ondas do teu cabelo,
Tatuados levemente, sempre que o dia reaparece,
Descobrindo a cama, já vazia,
De movimentos de paixão, louca.
Agora, nada mais interessa tanto, nem é mais interessante,
do que o meu interesse por ti.