Anda-se por aí... Dão-se passos uns á toa, outros á tona,
uns seguros, outros a pisar o risco quase a resvalar.
Anda-se por aí como quem se mexe do sítio para ocupar outro lugar.
Anda-se apenas ou vai-se andando por onde sabemos
sem chegar a caminhar.
E o mundo envelhece, perde a cor
e os olhos cegam por medo do que têm de enfrentar.
Anda-se por aí num contentamento em contratempo a fingir que sim,
que tudo está no devido lugar. Anda-se por aí calçado com desculpas
para ser mais confortável o andar.
E inventa-se um mundo como alternativa por ser mais conveniente
a mentira em que se quer acreditar.
Anda-se por aí sorridente por entre gente que não repara
em ninguém nem o sorriso lhes apetece.
Vai-se andando por aí num engano prolongado
em que todas noites se adormece para, de manhã,
acordar cansado. Há quem ande por aí neste esforço
desmedido de julgar que a vida é o que lhes chega ao ouvido.
Anda-se por aí acreditando que o tempo é muito,
quando, na verdade, é nada para tanta coisa
desfeita e tanta coisa por fazer.