Suponho que o verão foi roubado
ou que o calendário saltou uns quantos meses atrás
da chuva e do vento que vem do oceano.
À minha volta, a natureza parece ignorar a estação do ano,
as árvores coleccionam folhas de um outono adiantado
e eu não sei muito bem se as nuvens que o céu carrega
serão feitas de pesar, de tristeza ou apenas de água
desencontrada das estações frias.
Não que me faça diferença realmente,
mas não deixo de estranhar a peculiar sintonia
do meteorologia com o ritmo do mundo.
No meu inverno particular, os dias coincidem
com as noites frias de um verão ausente.
Não que isso me incomode,
o luto tem de ser feito debaixo de céu cinzento.
Quando morremos a alguém pouco importam as estações do ano.
Precisamos, sim, de uma primavera que nos pinte o olhar de tranquilidade
do azul viajado pelas andorinhas portadoras da boa nova.
O verão que aqui não chegou é um estado de ausência
que transcende o próprio tempo.
É um monumento cósmico erguido num buraco da alma.