Uma tarde com... o melhor amigo de Elvis
O paulista Walteir Terciani tem certeza absoluta: não existe ninguém no mundo que goste tanto do cantor quanto ele
* por Ana Laura Nahas
Há quem jure que não, mas, oficialmente, faz exatos 30 anos que Elvis Aaron Presley morreu. Uma overdose de antidepressivos e morfina parou seu coração no dia 16 de agosto de 1977 e turbinou o culto ao rebolado, ao vozeirão e à figura do astro. Ainda hoje, Memphis e a torcida do Flamengo caem de amores por ele, embora ninguém como o assistente social Walteir Terciani, 60 anos, o melhor amigo do Rei do Rock.
Eu não duvidaria se fosse você.
"Não sei se sou o maior fã ou o maior colecionador, como dizem, mas certamente sou a pessoa que mais gosta do Elvis no mundo", garante, com a autoridade de quem visita Graceland, a fortaleza real em Memphis, nos Estados Unidos, três vezes por ano, de quem comanda há quatro décadas o fã-clube Gang'Elvis e de quem guarda, com honras, uma
foto autografada pela própria majestade: "Para Walteir com os melhores desejos. De Elvis Presley".
Pergunto como ganhou a imagem. Ele conta que, em 1976, encarnou o garotinho da propaganda da bicicleta, adaptando e repetindo o clássico slogan da Caloi: "Não esqueça a minha foto". Durante seis meses, o pedido encerrava os cartões-postais e as cartas que enviava ao astro todo santo dia. Em junho de 1977, o retrato finalmente chegou pelo correio. "Fiquei emocionadíssimo", relembra Walteir, que, neste mês, volta a Memphis pela 26ª vez para participar da Elvis Week, uma semana inteira de exposições, debates e shows dedicados ao morador ilustre.
Ao redor do mundo, lançamentos marcam o 30º aniversário da morte, entre eles o documentário americano The Truth about Elvis, em que o diretor Adam Muskiewicz oferece US$ 3 milhões a quem provar que o Rei está vivo, e o livro Elvis Presley: The Family Album, do radialista George Klein (em pré-venda na Amazon.com por US$ 30). Um pacote de 11 DVDs com filmes do Elvis ator, remasterizados e restaurados digitalmente, também chega às lojas.
Walteir, claro, quer todos os produtos, como ocorre desde 1957, quando o filme e a canção A Mulher que Eu Amo firmaram seu primeiro contato com Elvis em Catanduva, no interior paulista. Um tinha 10 anos. O outro, 22. Um ouvia música caipira e cortava cana para ajudar a família. O outro, depois de ter sido porteiro de cinema e motorista de caminhão, horrorizava os conservadores e eletrizava os rebeldes com hits como Blue Suedes Shoes e Don't Be Cruel.
"Ouvi a música, assisti ao filme e disse: 'Meu Deus, esse é o cara. Eu quero ser como ele'", diverte-se o amigo-mor, que, impulsionado pela presença virtual de Elvis, aprendeu inglês, trocou o interior por São Paulo e estudou serviço social para ajudar os que precisam, tal e qual o cantor, que sofria de câncer nos ossos e empregou parte de sua fortuna em pesquisas sobre a doença e em entidades assistenciais.
Um encontro com o astro não chegou a acontecer. "Um amigo e eu havíamos juntado dinheiro para ir a Memphis em setembro de 1977. Correspondia-me com a secretária do Elvis e ela me ajudaria. Em agosto, Elvis morreu. Fiquei em estado de choque. Cancelei tudo, estava desiludido, não via sentido em ir."
Agora, nos arredores de Graceland, Walteir é Kenny, apelido que ganhou em razão da semelhança física com o cantor country Kenny Rogers. Por aqui, virou referência e é considerado a maior autoridade brasileira no assunto. Um fanático? Ele discorda. "Tenho as minhas coisas muito equilibradas. Tenho meu trabalho, meus irmãos, meus sobrinhos..."
Se o tempo transformou Elvis, trazendo-lhe profundos dissabores, Walteir sofreu com o ídolo. Quando morreu, aos 42 anos, o artista amargava o excesso de peso e uma cegueira parcial em decorrência de um glaucoma. Comento que, por trás da imagem pública, do requebrado e do sorrisão, o Rei tinha às vezes os olhos de um menino triste. O colecionador concorda, pára e suspira. "É, tinha sim... Sempre teve."