Dormi contigo a noite inteira
junto ao mar, na ilha.
Selvagem e doce eras
entre o prazer e o sono,
entre o fogo e a água.
Talvez bem tarde
nossos sonos se uniram
na altura e no fundo,
em cima como ramos
que um mesmo vento move,
embaixo como raízes
vermelhas que se tocam.
Talvez teu sono se separou do meu
e pelo mar escuro
me procurava como antes,
quando nem existias,
quando sem te enxergar
naveguei a teu lado
e teus olhos buscavam o que agora
- pão, vinho, amor e cólera -
- te dou, cheias as mãos,
porque tu és a taça que só esperava
os dons da minha vida.
Dormi junto contigo a noite inteira,
enquanto a escura terra
gira com vivos e com mortos,
de repente desperto
e no meio da sombra
meu braço rodeava tua cintura.
Nem a noite nem o sonho
puderam separar-nos.
Dormi contigo, amor,
despertei, e tua boca
saída de teu sono
me deu o sabor da terra,
de água-marinha, de algas,
de tua íntima vida,
e recebi teu beijo
molhado pela aurora,
como se me chegasse
do mar que nos rodeia.
Pablo Neruda
®Ana Maria Marya
14/01/10
Ita/Ba/Brasil
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