A bem da verdade, não sou essa mulher fatal que você pensa que eu sou. Aquelas histórias de sedução foram todas inventadas e esse ar superior, de quem sabe lidar com a vida, é apenas autodefesa.Aquelas frases filosóficas, foram só pra te impressionar, pra te passar essa ilusão de intelectual; Na verdade eu ainda nem sei se acredito nos valores que me ensinaram, quanto mais em frases feitas e opiniões formadas. Senta aí, vai! Deixa eu tirar os sapatos, desmanchar o penteado, retirar a maquiagem. Quero te mostrar que assim de perto não sou tão bonita quanto pareço, por isso uso todos esses artifícios. É que no fundo tenho um medo terrível de que você me ache feia, de que você encontre em mim uma série de imperfeições. Sabe, não quero mais usar essa máscara de mulher inatingível, de mulher forte com punhos de aço... No íntimo me sinto uma pequena ave indefesa, leve demais para enfrentar o vento, e deseja ficar no aconchego do ninho e ser mimada até adormecer. Olha pra mim, às vezes minha intimidade não tem brilho algum e você terá que me amar muito para suportar essa minha impotência. Deixa eu tirar o casaco, tirar o cansaço. Essa jornada dupla me deixa tão carente. A convicção de independência afetiva, é tudo balela! Eu queria mesmo era dividir a cama, a mesa, o banho... Queria dividir os sentimentos, os sonhos, as ilusões... Um pedaço de torta, uma xícara de café, algum segredo... Ah, eu tenho andado por aí, tenho sido tantas mulheres que não sou! Quantas vezes me inventei e até me convenci da minha identidade. Administrei minha liberdade. Tomei aviões, tomei whisky... troquei a lâmpada, abri sozinha o zíper do vestido... Decidi o meu destino com tanta segurança! Mas não previ que na linha da minha vida estivesse demarcada uma paixão inesperada. Ah, você queria falar alguma coisa? Está bem! Antes, só mais uma coisinha: estou morrendo de medo que você saia desta cena antes de mim, e eu tenha que recolocar minha máscara e me reinventar, outra vez."