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Natureza Morta
Quando eu cresci não lembro se era maio ou se fazia frio.
Reluziam-se, quase ao nível do chão e de meu olhar, vaga lumes vagando sem rumo ou borboletas douradas em bandos.
Quando eu cresci a claridade natural não existia ou se apagara há pouco.
Eu era imberbe, inexplicavelmente de barbas longas, sulcando meus poros., abrindo rugas profundas
Quando eu cresci se anunciava uma tempestade eterna; dancei na chuva que insistia em não cair, molhar a terra. No lodo misturei-me aos vermes, vesti águas que escorreram de minha face. E traguei angustia.
Quando eu cresci, pássaros não voavam, peixes não nadavam, os homens eram robôs. No ar, planavam máquinas, nos rios tiritavam de frio as gaivotas e as orquídeas-
Quando eu cresci a loucura fez-se natural num mundo desumano e meus versos e ecos do que eu era escaparam-se de mim num momento de descuido. E transformei-me em ave, rã, molusco, e hipocampo; quando cresci olhei pra dentro de mim num espelho e te vi chorando, pela primeira vez reconheci meu verdadeiro rosto estampado na sua retina úmida.
Quando eu cresci era o fim dos tempos na terra e a figura de um cogumelo imenso cobria o céu à frente de meus olhos e adornava suas bochechas ruborizadas. no universo infinito e pulsante que era seu corpo estático impresso em minha mente, como pano de fundo.
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