Fico quieto primeiro que paixão deve ser coisa discreta,
calada, centrada.
Se você começa a espalhar aos sete ventos, crau, dá errado.
Isso porque ao contar a gente tem a tendência a, digamos,
“embonitar” a coisa, e portanto distanciar-se dela,
apaixonando-se mais pelo supor-se apaixonado
do que pelo objeto da paixão propriamente dito.
Sei que é complicado, mas contar falsifica, é isso que quero dizer
— e pensando mais longe, por isso mesmo literatura é sempre fraude.
Quanto mais não-dita, melhor a paixão. Melhor, claro, em certo sentido
que signifíca também o pior: as mais nobres paixões são também as mais cadelas,
como aquelas que enlouqueceram Adele H.,
levaram Oscar Wilde para a prisão ou fizeram a divina Vera Fischer
ser queimada feito Joana d’Arc por não ser uma funcionária pública exemplar. "
((Caio Fernando Abreu))
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