A questão era se deveria se lançar. Seria um salto, mais um passo e cruzar fronteiras entre real e imaginário, entre razão e coração, sanidade e loucura. Um único salto e obter respostas aos questionamentos que se anunciavam prementes. Devaneio, mente correndo solta, buscando nos recônditos do ser alguma razão que impedisse esse salto.
Achou dentro de si alternâncias de caos e silêncios. Encontrava-se cercada por tantos signos. Estava escuro e nos corredores havia cobras, janelas. E em uma das janelas, avistava-se um jardim inóspito. Onde fora parar a flor daquela paisagem? Em que ares, em que paisagens estaria? Um prenúncio do fim ou do começo? Ah... a flor se feriu. E sangrava, chorava por haver mutilado a si mesma. Um corte profundo e não havia jardineiro que desse assunto pudesse tratar. Havia paliativos.
Deixemos a flor, pois é chegado seu tempo de descobertas e espera.
Quantas portas se fecharam sem garantia de novas aberturas? Quantas por abrir? Não se avista nesse cenário a mão que trará essas chaves ou mesmo as necessárias para que se dê início à abertura. Tudo está parado, expectante como se um véu baixasse e congelasse a paisagem do jardim, a flor ferida, as portas por fechar e abrir. A chama que trará calor, a paz. É uma trégua, bem sabido.
Quanto ainda por vencer em prol da almejada paz?
Um rio que corre, ora caudaloso, ora seco, sinuoso, direto pelas pedras do caminho por onde passa.
Outono-inverno ou primavera-verão... Quais as cores que prevalecerão?
Um urso que hiberna em sua gruta, alheio ao que se passa ou um casal de pássaros? De uma forma ou de outra, todo tempo é indicativo de vida renovada, exuberante ou não.
Quanto ao coração... Ah, o coração e a alma que volita, que sabe do tempo, das dores, alegrias e anseios, embora tudo seja uma confusão levando-a a sair menina, procurando por paz, amor.
A quem de direito?
A permanência num cenário que não lhe pertence, uma história em que não sabe o papel que lhe cabe, a despeito da vontade, da escolha, nada tendo a não ser o que, em sua procura, com que teme se defrontar por se saber fragilizada e nada irá saciar fome até que cuide de si, até que lamba suas feridas. Pode ser que essa angústia, essa necessidade de punição por não se achar merecedora de felicidade acabem. O que terá mais a perder?
Não deseja coisas mornas. Basta o peso das memórias, das escolhas, sonhos que ficaram no caminho. Não. Também não quer príncipe. Sem essa síndrome. Um sapo seria melhor, se bem que o ideal seria um vaso. Um vaso e elaborar seiva. E comungar as intimidades tal qual simbiose, osmose de emoções e pensamentos.
Um vaso, uma mão...
Decretada falência emocional de um projeto, de um amor, até que consiga se doar com a mesma intensidade. Que os olhos brilhem, o peito se encha de coisas boas.
Sim, seus motivos, suas vontades não se fizeram por ninguém e sim, por si mesma. E seus caminhos em sua maioria vieram por suas escolhas. Por isso mesmo se dá ao desfrute de errar. Paga a conta, ainda que não tenha percorrido sozinha.
Muitas vezes se viu voltando sobre seus rastros, parando de cansada, por falta de fé, abandonou companheiro que estava consigo e foi abandonada.
Outras vezes pensou ser melhor não ter nenhuma procura, nenhuma espera que tudo fosse como deserto de pessoas, sonhos, de amor.
Não obstante, no fundo não deixa de desejar, não dá pra fingir, enganar a si mesma e muitas vezes ela volta, mergulha dentro de si mesma num looping lento e constante.
Desejar... Sim, deseja, busca e se deixa ficar, se doa na medida necessária.
Talvez faltasse um gesto, uma palavra esperada em vão. Faltasse, faltava, faltará.
Palavras, gestos, chaves, portas, tudo está aí. Palavras que não ouvirá nem dirá, portas que fechará e fecharão pra ela, outras serão mantidas escoradas numa espera em vão. E os gestos que não fez e que não teve.
Ah, está tudo aí, é preciso olhos serenos, enxutos e alma, sobretudo alma. Acima de tudo alma-irmã, cúmplice, companheira: alma-amor, apenas isso. Apenas - síntese e simplesmente sem ter por que, como, quando. Existe e é. Algo que transcende.