Nada me define: meus vícios e minhas virtudes são insuficientes para tanto; minha felicidade talvez o faça melhor, embora por intervalos, sem continuidade e, sobretudo, sem motivo aceitável. O espírito humano, porém, reluta em se aceitar como obra do acaso, em ser apenas o produto fortuito do imprevisto ao qual nenhum deus preside, nem mesmo ele próprio. Uma parte de cada vida, e mesmo das vidas pouco dignas de atenção, passa-se à procura das razões de ser, dos pontos de partida, das origens. Minha incapacidade de descobri-los foi o que me fez, por vezes, inclinar-me às explicações sobrenaturais, procurando nas alucinações do ocultismo o que o senso comum não me proporcionava. Quando todos os cálculos complicados se evidenciam falsos, quando os próprios filósofos não têm nada mais a nos dizer, é desculpável que nos voltemos para o gorjeio fortuito dos pássaros, ou para o longínquo contrapeso dos astros.
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