★ VINICIUS DE MORAIS ★
O Poeta e a Rosa
© Vinícius de Morais
(E com direito a passarinho)
Ao ver uma rosa branca
o poeta disse: - "Que linda!
Cantarei sua beleza
como ninguém nunca ainda!"
Qual não é sua surpresa
ao ver, à sua oração,
a rosa branca ir ficando
rubra de indignação.
É que a rosa, além de branca
(Diga-se isso a bem da rosa...)
era da espécie mais franca
e da seiva mais raivosa.
- "Que foi?", balbucia o poeta...
E a rosa: - "Calhorda que és!
Pára de olhar para cima!
Mira o que tens a teus pés!
E o poeta vê uma criança
suja, esquálida, andrajosa,
comendo um torrão de terra
que dera existência à rosa.
- "São milhões!", a rosa berra;
"milhões a morrer de fome
e tu, na tua vaidade
querendo usar do meu nome!...
E num acesso de ira,
arranca as pétalas, lança-as
fora, como a dar comida
a todas as crianças.
O poeta baixa a cabeça.
- "É aqui que a rosa respira..."
Geme o vento. Morre a rosa.
E um passarinho que ouvira,
quietinho, toda a disputa,
tira do galho uma reta,
e ainda faz um cocozinho,
na cabeça do poeta...
© Vinícius de Morais
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