O que será que Chico Buarque quis dizer em 1971 quando ele escreveu: "Todo dia ela faz tudo sempre igual." Eu fiquei pensando nisso, me vieram duas conclusões. Uma é que o amor se revela nas repetições, e que também é a ambição querer uma vida tranquila. Como é que eu vou explicar o milagre do cotidiano, ser acordada às seis, receber um sorriso pontual, e ainda assim sentir seu mundo renascer? O tempo passa, meio século já passou desde que essa música foi escrita, mas ainda há graça em dividir as primeiras horas do dia com alguém. Mas o amor, sendo muito maior do que a rotina dos dias deliciosamente quase iguais, às vezes transborda como um copo menor que a sede, aí eu lembro do Djavan, que uma vez disse: "Você deságua em mim e eu oceano." Então entre a poesia do cotidiano de Chico e a imensidão e a benção de ser banhada por águas de Marias de Djavan, a vida se constrói. Nenhum deles e nem eu falamos aqui de relógio, mas sim da pequena eternidade dos gestos diários, da vastidão de um amor que tem liberdade pra transbordar e da conclusão que a vida se faz do intervalo entre o café da manhã e a frase: Precisamos ir ver o mar! Olha, tem pessoas que me fazem pensar nessas coisas e com certeza elas acreditam em mim.

— .(Escrito dia 20/09/2025, às 19:05).